quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Q&A Stopmotion Portugal - Jerónimo Ribeiro Rocha

Conheci o seu trabalho quando pela primeira vez vi o trailer da curta metragem "Breu". Imediatamente senti uma forte necessidade de ver algo que aparentava ser tão rico visualmente quanto perturbador mentalmente. Procurei na net, descobri mais tarde que tinha passado em alguns festivais em que o cartaz me tinha passado a lado e durante uns dois anos volta e meia pensava...onde é que raio vou ver isto agora!?!?

Há uns meses atrás ao vasculhar compulsivamente o Vimeo encontrei uma pequena pérola em Stop Motion que inicialmente pensei ser Francesa por razões óbvias, não fosse a ficha técnica repleta de nomes como Jerónimo Ribeiro Rocha, Tiago Xavier, Joana Soares, Filipe Lopes, Miguel Urbano, Tomás Marques, Martim Almeida e Frederico Serra. Uma verdadeira produção Take it Easy.

Após umas trocas de simpáticas mensagens e de ter chegado à conclusão que se tratava do mesmo realizador lá tive a oportunidade de finalmente ver o tão aguardado "Breu" no conforto do meu computador. Valeu a pena a espera.

Link para o Filme "Les Paysages" aqui.
Trailer do Filme "Breu" aqui.

Nascido no Porto em 81. Estudou Artes Gráficas na Soares dos Reis, e fez o curso de Pintura nas Belas Artes do Porto e uma pós graduação na Escola de Cinema de Madrid em Argumento, Pitch e Desenvolvimento de Projectos Audiovisuais. Em Dezembro de 2005 começou a trabalhar na Take it Easy como realizador, editor, ilustrador e... ah! animador.


Nome: Jerónimo Ribeiro Rocha
Idade: 30



Foto por: Tiago Xavier



SMP - Quando foi o teu primeiro contacto “consciente” com o Stop Motion?
JRR - Se por consciente te referes à primeira vez que me lembro de ver stop motion, diria que foi naquela espécie de jogo de xadrez com monstrinhos que o R2-D2 joga com o Chewie no Millenium Falcon na “Guerra das Estrelas” e no “Choque dos Titãs”, animado pelo Ray Harryhausen. Se bem que acho que na altura pensava: que movimentos tão bizarros têm estas criaturas!



SMP - Quando é que chegaste à conclusão, “Eu tenho que experimentar isto!” e qual o teu primeiro projecto ou experiência utilizando esta técnica? JRR - Acho que o meu primeiro projecto mais a sério foi um videoclip que fiz em 2003 com o Nico Guedes, na altura um colega de Faculdade (e que mais tarde seria o responsável pela minha ida para a Take) para a sua banda da altura: os Big Fat Mamma. O título era “Seus Olhos”. E foi a primeira vez que me senti a experimentar o processo de animação na sua plenitude. O conceito, os storyboards, a construção dos sets e dos bonecos. Foi muito fixe ver, primeira vez, o projecto a nascer e crescer. Metia tudo e mais alguma coisa porque nós queríamos experimentar tudo: fundos chroma, cenários em 3D, animação de plasticina. A ingenuidade do resultado, especialmente visto agora, deve ser de morrer a rir. Mas valeu bem a pena.


Imagens da Curta metragem "Breu":











SMP - Realizaste, já há uns anos, uma curta metragem de nome “Breu”. Lembro-me de ter visto o trailer e de ter ficado surpreendido pela diversidade de técnicas e estilos apresentados. Fala-nos um pouco sobre como foi trazer esse projecto à luz.
JRR -
O BREU foi uma longa e estranha aventura, se bem que recompensadora. Começou em 2005, quando estava a estudar argumento e pitch de projectos na escola de cinema de Madrid. Apeteceu-me fazer um projecto pequeno para desenjoar do processo de desenvolvimento de um projecto audiovisual que andava lá a dissecar há já um ano. Mal sabia no que me ia meter... Inicialmente ia ser uma experiencia gore chamada “Mau Dia”, depois mudou. Acabei o argumento e fui filmar para Aveiro com o meu bom amigo Tiago Xavier e uma equipa de amigos. Mas quando acabamos não gostei muito do resultado: estava desinteressante e com tempo a mais. O clímax da história não justificava os 25 minutos que se antecediam. Entretanto mudei-me para Lisboa, fui trabalhar para a Take e o BREU ficou na gaveta. Passaram-se dois anos e muita insistência da parte do Xavier, para que eu pegasse novamente no projecto. Rescrevi o argumento sobre o que estava editado e criei uma regra: se fosse necessário criar sequências novas, seria sobre a forma de animação. Das sequências novas que surgiram, distribui-as por diferentes amigos para animarem. Escrevi uma narração que acompanhava a nova estória e que foi impecavelmente interpretada pelo José Pinto. Ainda conseguimos trabalhar com o Artur Agostinho na narração de uma das animações. Dois anos depois, em finais de 2009, o BREU, agora com 13 minutos, 13 segundos e 13 frames (mais créditos), estava prestes a ser lançado.







SMP - Recentemente realizaste a curta “Les Paysages”, como é que a ideia surgiu?
JRR -
Tinha ido ao Festival do Cinema Francês, no São Jorge, e estava a descer a Avenida da Liberdade a caminho de casa quando reparei que estavam a fazer uma daquelas pequenas feiras urbanas na Praça da Alegria. Foi numa das tendas que descobri os carrinhos do LES PAYSAGES: um Pão-de-Fôrma e um Carocha, com os respectivos atrelados. Fiquei ainda um bom bocado a namorá-los e a tentar decidir qual deles levava. Como não tinha dinheiro comigo, pedi à senhora para os guardar enquanto procurava um multibanco pelas redondezas. E foi nesse percurso que percebi que era imperativo que os levasse aos dois, porque tinham uma viagem a fazer. O conceito era simples: para as miniaturas, o mundo gigante do escritório são montanhas, vales, praias e cidades – paisagens – e os humanos não são mais que efeitos atmosféricos, como nuvens que passam; e para nós, os carrinhos são pura e simplesmente inexistentes, porque não temos tempo para os observar, porque temos mais que fazer.



SMP - Fala-nos um pouco na equipe com quem trabalhaste e no método de trabalho utilizado. Não deve ter sido fácil filmar durante o expediente de um estúdio como a Take it Easy?  

JRR - Neste projecto trabalhei com a Joana Soares, que me assistiu em tudo desde o planeamento à montagem dos nossos minúsculos sets; o Tiago Xavier, que se ocupou de tudo que teve a ver com a imagem – fotografia, iluminação – e foi essencial nas soluções técnicas como a água do lago ou a fogueira do acampamento; o Filipe “Filk” Lopes, que compôs uma melodia feita à medida para a peça; o Martim Almeida que trabalhou arduamente para sonorizar todos os pequenos detalhes e tolerou as minhas constantes “notas” de sonorização; e por fim o Frederico Serra, que está sempre nos bastidores e insiste em acreditar em projectos como o Easylab.






Se, enquanto que num projecto comercial nós utilizaríamos um software para nos ajudar à visualização da animação e seguir o animatic à risca; neste caso de desbunda criativa, fazemos a animação às cegas, ou seja, fotografamos todos os frames do plano apenas com um monitor ligado à câmara (e às vezes nem isso) e no fim vemos o resultado. Depois fazemos outro take se quisermos alguma coisa diferente. Sem animatics nem testes. O plano, às vezes, é o teste.


O processo de pós produção foi também de exploração, experimentei matte paintings no plano do albergue, neve no plano pós créditos, grafismos que nos remontassem à época da nouvelle vague francesa, como na música do Filk.














Foi muito mais fácil de filmar ali do que seria em qualquer outro escritório porque na Take já é conhecido (e tolerando) há algum tempo um grande nível de demência e caos que vem com a criatividade. E também porque as pessoas que trabalham na Take estão, felizmente, longe de serem normais. Pessoal a andar de bicicleta nos corredores? Normal. Tipos vestidos de macaco a atazanar as pessoas desde a varanda? Típico. Malta a fazer um stop motion de miniaturas na máquina fotocopiadora? Mais um dia no escritório.



SMP - Como foi ter uma animação em destaque no blog do Vimeo
JRR -
Fiquei surpreendido. Imaginei que pela universalidade do conceito, o LES PAYSAGES pudesse pegar em alguns sites, mas o que descobri foi a vida de um verdadeiro viral. Começou pelo DEVOUR.com, e de repente estava em blogs americanos, ingleses, italianos, holandeses, finlandeses, japoneses (os comentários japoneses que conseguimos traduzir são deliciosos) até eventualmente o próprio VIMEO o colocar no staff picks: a “selecção da casa”. Na primeira quinzena após fazermos o upload, todos os dias éramos presenteados com uma surpresa no número de views e na constante publicidade que o filminho gerava lá fora.



SMP- Como defines o Easy Lab?
JRR -
Isso é uma pergunta de rasteira? Porque não é fácil de definir. O Easylab é o espaço (e o tempo) de criatividade da Take it Easy. É o espaço da desbunda pessoal, com o apoio dos demais que quiserem apoiar. É um espaço onde se pode e deve fazer de tudo: desde reclames a filminhos de intervenção social, passando por experiências no âmbito das artes plásticas. Animação, vídeo, instalação. E se bem que não é um espaço fácil de habitar por requerer muita auto disciplina e constante auto redefinição, como em todos os espaços onde há demasiada liberdade, é um conceito muito inovador e muito raro em Portugal.



SMP - Se tivesses a oportunidade de produzir um projecto teu, daquelas situações irreais onde dinheiro não é um problema, optarias por animação ou imagem real?
JRR -
Qualquer uma das duas. Para mim, o importante é ter o tipo de liberdade que tinha na infância: trepar para cima de uma árvore com os meus colegas – os restantes renegados que, tal como eu, não gostavam de jogar à bola – e reinventar os filmes e series que víamos. Além disso, o dinheiro nunca deve ser um problema. Não ser genuíno é que é um problema, e grave.



SMP - Em que projectos, pessoais ou profissionais, estás a trabalhar/planear actualmente?
JRR -
Neste momento estou a trabalhar numa serie que a Take está a produzir para a RTP com o Bruno Nogueira e o Gonçalo Waddington. Fiquei incumbido de, juntamente com o Easylab, criar o genérico feito em animação que será uma espécie de descendente do LES PAYSAGES, agora feito com alguns requintes de malvadez que nos pudemos permitir por ter um pouco mais de meios de produção. Vou também realizar uma sequência animada que surgirá a meio da serie. E para finalizar, vou ser o editor da dita.

Para um futuro não demasiado longínquo tenho na calha um projecto que é uma aventura pelo universo do norte de Portugal, do folclore, de lendas, de espíritos e sombras. Do diabo.



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John Cleese - a lecture on Creativity


The Murf music video (Rendezvous) animated by Scott Benson
 

Words by Everyone

Behind the scenes:

 





























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